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A ARGILA REFLETINDO O MUNDO INTERNO DA CRIANÇA ABRIGADA

 

A psicologia, ao tratar do desenvolvimento infantil, entende que a criança se percebe a partir do olhar do outro, principalmente das  figuras parentais que lhe oferecem afeto e proteção. E assim, vão se constituindo como sujeitos, construindo sua identidade, seu auto-conceito, que lugar ocupam neste mundo. E como isso funciona com a criança abrigada? Que olhar é esse?  Que outro é esse? Que lugar é esse?

No  encontro entre a nossa equipe técnica e  as crianças realizamos a dinâmica da "argila: espelho da auto-expressão",como forma lúdica de conhecê-las. Se trata de um projeto antigo meu: levar o trabalho com a argila para as instituições, o que me foi permitido no Quintal de Ana com o projeto Um Lar para Todos. Apesar de só ter conseguido concluir a primeira fase (não foi possível realizar a fase da pintura, devido às regras relacionadas a horários existentes no abrigo), foi de grande valia nosso trabalho com relação a perceber estas crianças no seu contexto institucional. As esculturas nos mostraram um grito de socorro: baixa auto-estima, timidez elevada, carência afetiva extrema, insegurança, medo, desesperança.,sentimento de inferioridade.. Na realidade não é necessário ter a formação de psicólogo para compreender as esculturas: é só olhar com os olhos do coração.

Os prejuízos do abrigamento prolongado são enormes, as perdas algumas vezes irreparáveis, tendo como sofrimento maior o de não ser importante para ninguém.Quanto maior o tempo de institucionalização mais esta criança internalizará a lógica institucional, tornando-se o único referencial para ela, permeando toda a sua vida cognitiva, afetiva e emocional. A dinâmica institucional não é a do sujeito, da individualidade e sim da conveniência da instituição de suas regras funcionais e disciplinares .Portanto, a identidade formada passa a ser a institucional, o abandono faz parte da sua história, onde  você não é especial, não pertence a alguém, não é objeto de um afeto incondicional.

Como psicodramatista, às vezes  imagino um grande psicodrama público:  de um lado estão as crianças abrigadas, e de outro a sociedade, profissionais direta e indiretamente relacionados, setores públicos. Vivenciaríamos uma inversão de papéis, onde trocaríamos de lugar com essas crianças e por um momento, através da ação dramática, passaríamos a sentir  o que elas sentem. Se colocar no lugar do outro...A dor do nao-pertencimento e do abandono. Será que só assim compreenderíamos?

Penso que , enquanto seres de afeto  que somos é preciso aceitarmos  essas crianças como nossas crianças. Acreditando, a partir daí, que  é de nossa inteira  responsabilidade provê-las com o nosso cuidado e nosso amor. Sempre.

 

´´Um encontro de dois: olhos nos olhos, face a face.

E quando estiveres perto, eu arrancarei os teus olhos

e os colocarei no lugar dos meus,

e tu arrancarás os meus olhos

e os colocará no lugar dos teus,

eu então o olharei com os teus olhos,

e tu me olharás com os meus´´.

(J. L. Moreno)

 

Maria Thereza C. Motta (psicóloga-argilina-psicodramatista)

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